segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Perdimento indevido decretado pelo Fisco gera indenização por lucro cessante

Abuso do Estado
Por Jomar Martins

A decretação ilegal da pena de perdimento de mercadorias, pelo Fisco, gera lucros cessantes indenizáveis. Afinal, sem matéria-prima para trabalhar, é clara a restrição à atividade empresarial. O entendimento levou a 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região a reformar sentença que negou indenização a uma empresa de Foz do Iguaçu (PR), que teve a carga de camisetas apreendida pela Receita Federal por suspeita de importação irregular. O juízo local acatou o argumento, lançado no auto-de-infração que reteve a carga, de que as notas fiscais não tinham idoneidade.

Os desembargadores concluíram, no entanto, que as notas eram idôneas, pois a emissão foi reconhecida pelas respectivas vendedoras em juízo. Assim, o Fisco não poderia imputar à parte autuada a responsabilidade pelo descumprimento de obrigação acessória no preenchimento das notas fiscais, especialmente porque elas foram emitidas por empresas regularmente estabelecidas no Brasil.
O relator da Apelação, desembargador Joel Ilan Paciornik, explicou que o lote trazia peças refugadas por grandes empresas, vendidas como sobras, a empresas de pequeno porte, como a parte autora, que as reciclam e revendem no varejo. ‘‘Destaque-se que é característico desse mercado as mercadorias serem comercializadas por quilo, sem especificação de marca, modelo, tamanho, vendido a um só preço, não havendo nenhuma ilegalidade nessa prática. É o chamado lote fechado, vendido em sacos de 20 ou 50 quilos cada’’, registrou no acórdão.

Conforme o relator, embora a apreensão não tenha sido propriamente ilegal, a conclusão pela pena de perdimento configura a ilegalidade, pois a autoridade administrativa, ao constatar a inexistência ou insuficiência de provas para amparar a retenção, tinha o dever de autorizar a liberação, e não decretar o perdimento. A definição do valor da indenização pelos lucros cessantes, devido à falta de elementos, acabou relegada à fase de liquidação de sentença. O acórdão foi lavrado na sessão do dia 30 de julho.

Ação anulatória
Em 16 de julho de 2008, a Receita Federal apreendeu, em Foz do Iguaçu (PR), uma carga contendo 7,1 mil camisetas, pertencente à empresa Kilomania Comércio de Confecções Ltda, situada naquele município. O auto-de-infração apontou que as roupas tinham origem estrangeira, entraram ilegalmente no país e as notas fiscais apresentadas não eram idôneas. Por meio de marca própria, a empresa comercializa peças de vestuário que possuem defeitos de fabricação, adquiridas por quilo e sem etiquetas.

Como não conseguiu liberar a carga em nível administrativo — a Receita acabou decretando o seu perdimento —, a Kilomania entrou na Justiça com Ação Anulatória de Auto-de-Infração, cumulada com Pedido de Danos Morais e Materiais, contra a União, representando a Fazenda Nacional. Na inicial, argumentou que as camisetas foram adquiridas regularmente em território brasileiro. Explicou que essas peças, de segunda qualidade, são comumente vendidas por quilo pelas indústrias — lotes fechados de 20kg cada. Logo, não trazem especificações de marca, modelo ou tamanho.

Esclareceu que o fato de grande parte das peças vir acompanhada com as etiquetas com a inscrição ‘‘Henry’’ não caracteriza ilegalidade. Estas foram colocadas com única finalidade classificar as peças por tamanho e composição, já que haviam sido adquiridas sem etiquetas.

Finalizando, alegou que a apreensão da carga levou à interrupção das vendas de roupas de ‘‘segunda mão’’, responsável pela maior parte parcela de suas receitas. Além disso, teve de fechar a oficina de reparação de peças de vestuário e dispensar funcionários.

A sentença
O juiz federal substituto Sergio Luís Ruivo Marques julgou a ação improcedente, por entender que a Kilomania não comprovou a aquisição regular das peças de indústrias brasileiras. ‘‘Com efeito, as notas fiscais emitidas pela KBO Empresa Indústria e Comércio de Confecções Ltda descrevem mercadorias vendidas para a autora como ‘camisetas diversas, ‘camisetas 2º qualidade’, ‘camisetas diversas’, ‘meia malha 2º qualidade’. Já a nota emitida pela Comércio Indústria Resima SA descreve as mercadorias como ‘saldos de confecção em quilo – algodão’. Impossível, portanto, afirmar que os vestuários apreendidos correspondem àqueles descritos nessas notas’’, escreveu na sentença.

Além disso, destacou o juiz, os representantes legais dessas indústrias não puderam afirmar em juízo que as camisetas apreendidas correspondem às camisetas vendidas para a parte autora. Isso sem falar na enorme quantidade de camiseta com inscrição em inglês na etiqueta, o que é incomum na venda de peças refugadas pelos grandes fabricantes, a fim de preservar suas marcas.

Clique aqui para ler o acórdão.
Clique aqui para ler a sentença.

Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.

Revista Consultor Jurídico, 7 de setembro de 2014, 09:47

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