Um tema frequentemente debatido nos tribunais administrativos e judiciais é o da interposição fraudulenta de terceiros. Este instituto pode ser definido como sendo a participação de terceiro nas operações de comércio exterior, objetivando ocultar o real vendedor, comprador ou o sujeito responsável pela operação, a ser praticada mediante fraude ou simulação.
Por caracterizar dano ao erário, a punição da interposição fraudulenta de terceiros se dá com a pena de perdimento das mercadorias importadas, que pode ser convertida em pena pecuniária caso as mercadorias não sejam encontradas ou tenham sido consumidas. Ocorre dano ao erário, seja por violação ao controle político (soberania das fronteiras - violação do procedimento e do controle prévio), seja por violação ao controle tributário (diferença na cobrança de tributos).
A legislação em vigor estabelece também três situações de presunção de interposição fraudenta: (i) quando não há comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados; (ii) quando realizada mediante utilização de recursos de terceiro, sem o cumprimento das exigências legais estabelecidas para o tipo de importação por conta e ordem de terceiro; e (iii) quando realizada mediante utilização de recursos próprios, sem o cumprimento dos requisitos e condições estabelecidos para a importação por encomenda.
Ausente a comprovação do dano ao erário, deve-se flexibilizar a pena de perda da mercadoria estrangeira
Por se tratar de hipótese de presunção legal relativa, pode o interessado apresentar elementos que comprovem a sua inocência em relação à acusação de interposição fraudulenta.
Para tratar da interposição fraudulenta é preciso traçar as diferenças entre os tipos de importação anteriormente mencionados.
A importação por conta própria é aquela onde o importador é parte no negócio jurídico que interna a mercadoria, na qualidade de comprador, e utiliza recursos próprios ou financiamento por ele obtido, constituindo um serviço prestado por uma empresa - a importadora -, a qual promove, em seu nome, o despacho aduaneiro de importação de mercadorias adquiridas por outra empresa - a adquirente -, em razão de contrato previamente firmado, que pode compreender ainda a prestação de outros serviços relacionados com a transação comercial, como a realização de cotação de preços e a intermediação comercial.
A importação por encomenda, por sua vez, é aquela em que uma empresa adquire mercadorias no exterior com recursos próprios e promove o seu despacho aduaneiro de importação, a fim de revendê-las, posteriormente, a uma empresa encomendante previamente determinada, em razão de contrato entre a importadora e a encomendante, cujo objeto deve compreender, pelo menos, o prazo ou as operações pactuadas.
A existência de fraude ou simulação é, a nosso ver, condição necessária para a ocorrência da interposição fraudulenta de terceiros, devendo ser provada pelas autoridades fiscais quando da lavratura de autos de infração. Esse entendimento, inclusive, vem sendo ratificado pelos tribunais federais, destacando-se o Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região (cf. processos 2006.70.08.001303-3/PR, 2005.04.01.046205-1/PR e 2006.72.08.001293-8/SC). Existe, no entanto, posição contrária no sentido de não condicionar a caracterização da infração à demonstração da ocorrência da fraude ou simulação (cf. acórdão Carf 3102-01.239).
Não se pode sustentar, ademais, a existência de dano ao erário sem que haja efetivamente a intenção dolosa de praticar a fraude ou a simulação visando interpor terceira pessoa nas operações de comércio exterior. Tem sido esse, inclusive, o entendimento mais recente da jurisprudência dos tribunais federais, incluindo-se o Superior Tribunal de Justiça (cf. REsps 331548/PR, 1019136/SP, 512517/SC e 946684/RJ), ou seja, ausente a comprovação do dano ao erário, deve-se flexibilizar a aplicação da pena de perda da mercadoria estrangeira prevista na legislação.
Outro aspecto que tem sido levado em consideração pelos tribunais para afastar a determinação de perdimento de bens declarada pelas autoridades fiscalizadoras é a demonstração da boa-fé das pessoas envolvidas nas operações de comércio exterior (cf. TRF-1 processos 2004.34.00.008290-8 e 2003.39.00.002831-4; TRF-2 processos 2008.51.01.019548-5 e 2000.02.01.068483-5).
Por todas as razões expostas é que a interposição fraudulenta de terceiros merece ser objeto de reflexão permanente daqueles que atuam nas operações de comércio exterior.
Gilberto de Castro Moreira Junior é doutor em direito econômico e financeiro pela USP, conselheiro da 3ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e sócio de Lautenschlager, Romeiro e Iwamizu Advogados
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações
Por caracterizar dano ao erário, a punição da interposição fraudulenta de terceiros se dá com a pena de perdimento das mercadorias importadas, que pode ser convertida em pena pecuniária caso as mercadorias não sejam encontradas ou tenham sido consumidas. Ocorre dano ao erário, seja por violação ao controle político (soberania das fronteiras - violação do procedimento e do controle prévio), seja por violação ao controle tributário (diferença na cobrança de tributos).
A legislação em vigor estabelece também três situações de presunção de interposição fraudenta: (i) quando não há comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados; (ii) quando realizada mediante utilização de recursos de terceiro, sem o cumprimento das exigências legais estabelecidas para o tipo de importação por conta e ordem de terceiro; e (iii) quando realizada mediante utilização de recursos próprios, sem o cumprimento dos requisitos e condições estabelecidos para a importação por encomenda.
Ausente a comprovação do dano ao erário, deve-se flexibilizar a pena de perda da mercadoria estrangeira
Por se tratar de hipótese de presunção legal relativa, pode o interessado apresentar elementos que comprovem a sua inocência em relação à acusação de interposição fraudulenta.
Para tratar da interposição fraudulenta é preciso traçar as diferenças entre os tipos de importação anteriormente mencionados.
A importação por conta própria é aquela onde o importador é parte no negócio jurídico que interna a mercadoria, na qualidade de comprador, e utiliza recursos próprios ou financiamento por ele obtido, constituindo um serviço prestado por uma empresa - a importadora -, a qual promove, em seu nome, o despacho aduaneiro de importação de mercadorias adquiridas por outra empresa - a adquirente -, em razão de contrato previamente firmado, que pode compreender ainda a prestação de outros serviços relacionados com a transação comercial, como a realização de cotação de preços e a intermediação comercial.
A importação por encomenda, por sua vez, é aquela em que uma empresa adquire mercadorias no exterior com recursos próprios e promove o seu despacho aduaneiro de importação, a fim de revendê-las, posteriormente, a uma empresa encomendante previamente determinada, em razão de contrato entre a importadora e a encomendante, cujo objeto deve compreender, pelo menos, o prazo ou as operações pactuadas.
A existência de fraude ou simulação é, a nosso ver, condição necessária para a ocorrência da interposição fraudulenta de terceiros, devendo ser provada pelas autoridades fiscais quando da lavratura de autos de infração. Esse entendimento, inclusive, vem sendo ratificado pelos tribunais federais, destacando-se o Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região (cf. processos 2006.70.08.001303-3/PR, 2005.04.01.046205-1/PR e 2006.72.08.001293-8/SC). Existe, no entanto, posição contrária no sentido de não condicionar a caracterização da infração à demonstração da ocorrência da fraude ou simulação (cf. acórdão Carf 3102-01.239).
Não se pode sustentar, ademais, a existência de dano ao erário sem que haja efetivamente a intenção dolosa de praticar a fraude ou a simulação visando interpor terceira pessoa nas operações de comércio exterior. Tem sido esse, inclusive, o entendimento mais recente da jurisprudência dos tribunais federais, incluindo-se o Superior Tribunal de Justiça (cf. REsps 331548/PR, 1019136/SP, 512517/SC e 946684/RJ), ou seja, ausente a comprovação do dano ao erário, deve-se flexibilizar a aplicação da pena de perda da mercadoria estrangeira prevista na legislação.
Outro aspecto que tem sido levado em consideração pelos tribunais para afastar a determinação de perdimento de bens declarada pelas autoridades fiscalizadoras é a demonstração da boa-fé das pessoas envolvidas nas operações de comércio exterior (cf. TRF-1 processos 2004.34.00.008290-8 e 2003.39.00.002831-4; TRF-2 processos 2008.51.01.019548-5 e 2000.02.01.068483-5).
Por todas as razões expostas é que a interposição fraudulenta de terceiros merece ser objeto de reflexão permanente daqueles que atuam nas operações de comércio exterior.
Gilberto de Castro Moreira Junior é doutor em direito econômico e financeiro pela USP, conselheiro da 3ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e sócio de Lautenschlager, Romeiro e Iwamizu Advogados
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações
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