segunda-feira, 21 de abril de 2014

Não é a taxa de juros, é o gasto

Revista ISTOÉ Dinheiro - 21/04/2014

Ao apresentar o Orçamento, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que a alta de preços era temporária, mas não falou de reduzir as despesas do governo
Por Denize Bacoccina

São comuns, nas conversas ao vivo ou nas redes sociais, os comentários sobre como os preços estão fora de controle, e como o índice oficial de inflação não reflete o que as pessoas encontram quando vão às lojas. Em seguida vêm as histórias de como tal alimento dobrou de preço, como certo restaurante está extrapolando na conta ou a tabela do salão de beleza aumentou 30% de uma vez. Embora não seja razoável pensar que em manipulação - o Brasil, afinal, não é a Argentina - a percepção das pessoas não está de todo equivocada. Nos últimos anos, alimentos e serviços vêm subindo mais que o índice oficial, que, por sua vez, tem sido constantemente superior aos 4,5% ao ano do centro da meta.

Na primeira semana de abril, o Banco Central elevou os juros pela nona vez seguida desde que iniciou o movimento de recuperação, em abril do ano passado, em mais uma tentativa de trazer a inflação para baixo. Nesse período, a Selic passou de 7,25% para 11%, mas o IPCA cedeu apenas levemente, de 6,49% para 6,15%. Depois de tanta demonstração de preocupação com o custo de vida, seria de se esperar que todos respirássemos aliviados com a sensibilidade da autoridade monetária e que as expectativas recuassem. Pois ocorreu exatamente o oposto. Nas semanas seguintes, as projeções do mercado aumentaram e hoje já batem perigosamente no limite superior da meta, de 6,5%.

O que deu errado? O aumento dos juros não era exatamente o que o mercado vinha pedindo? Mais ou menos. É verdade que era unânime a avaliação sobre os riscos de se permitir que o monstro mostrasse sua cara, ainda que só pela frestinha da porta. Mas esse era apenas parte do alerta. A outra parte era a necessidade de segurar os gastos públicos. Se a inflação é causada por uma oferta que não dá conta da demanda, não adianta contrair a demanda privada e continuar estimulando a do governo. E essa parte ainda não está sendo feita. Ao contrário. O governo não parece ver o problema dessa forma.

Na apresentação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), na terça-feira 15, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, reafirmou que a inflação está sob controle. Disse que a alta era temporária, fruto de um repique do preço dos alimentos, em conseqüência da seca no início do ano. Ou seja, assim como São Pedro aumentou a inflação, ele vai diminuir. Para o ministro, os preços devem começar a ceder nos próximos meses, mas não está claro quando exatamente. O próprio Banco Central,por exemplo, afirma, no relatório de inflação divulgado em março, que o índice chegará ao pico no terceiro trimestre deste ano. Ou seja, ainda vai subir, antes de começar a ceder.

Ainda falta atuar nos gastos do governo. Depois de centenas de bilhões de reais em desonerações, a economia vai crescer neste ano metade da média mundial, de acordo com os organismos internacionais. Em vez de enxugar despesas para permitir um ambiente de negócios competitivo, o governo continua perdendo tempo - e dinheiro público - em políticas com duvidoso efeito para a atividade econômica. É o caso da redução da conta de energia, que não diminuiu o custo das empresas, pois os grandes consumidores compram no mercado livre. E para o consumidor doméstico a pequena diminuição de agora terá um custo alto quando o País começar a pagar a fatura dos gastos do Tesouro com as termoelétricas e o socorro às distribuidoras. Enquanto isso, o BC vai continuar tentando enxugar gelo com a taxa de juros.

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