Antonio Perez e Aline Oyamada
Metamorfose ambulante não seria uma má definição para a comunicação recente do Banco Central (BC). Em um período de cerca de 15 dias, a política monetária aparentemente trocou de roupa pelo menos três vezes.
Na apresentação da nova equipe econômica, no dia 27 de novembro, a política monetária estava "especialmente vigilante", garantiu Alexandre Tombini, o presidente do BC. Em 3 de dezembro, ao mesmo tempo em que intensificou o ritmo de aperto e elevou a taxa Selic em 0,50 ponto, para 11,75%, o BC avisou: daqui para frente, a política monetária seria conduzida com parcimônia. No dia 9, em audiência pública no Congresso Nacional, Tombini não falou nem "parcimônia" nem "especialmente vigilante". A política monetária, disse o presidente do BC, deve se manter "ativa".
Ao invés de vir para explicar, a expressão "ativa" acabou por confundir ainda mais. Em conversa com economistas, alguns com passagem pelo próprio BC, o Valor ouviu interpretações díspares. Consenso apenas em torno da expectativa de que a ata do Comitê de Política Monetária (Copom), que sai hoje, esclareça, afinal, qual é o recado que o BC quer passar. E, se o documento ainda deixar dúvidas, Tombini terá uma segunda chance, em almoço hoje na Federação Brasileira de Bancos (Febraban).
"O forte do BC nunca foi a comunicação", ironiza um ex-diretor do BC, que, apesar disso, faz uma leitura de qual deve ser a mensagem por trás dos sinais mistos das últimas semanas. Provavelmente, diz, o Copom está tentando sinalizar que o ciclo de aperto será extenso, mas feito a passos moderados.
Para o ex-diretor, com uso da palavra parcimônia em seu comunicado, o BC quis mostrar que pode desacelerar o ritmo e subir a Selic em 0,25 ponto percentual, para 12%, em janeiro. Mas, para evitar a ideia de uma política monetária mais branda, Tombini usou a palavra "ativa", indicando que o ciclo não necessariamente será curto. "A ata vai tentar explicar isso."
Para um participante do mercado, a ata representa uma nova chance para o Copom deixar claro o que pretende. Tanto a referência à parcimônia quanto o uso do adjetivo ativa, no lugar do "especialmente vigilante", sugerem que o BC não apenas quer diminuir o ritmo em janeiro como não vai estender o ciclo de aperto.
Na ata, diz esse profissional, o Copom pode tanto ratificar o quadro de aperto menos intenso quanto "desmentir" o comunicado e adotar uma postura mais dura. Seja qual for a escolha, esse zigue-zague da comunicação é ruim e mostra que o BC não tem uma "estratégia clara" e age "ao sabor dos ventos" - o que mina a credibilidade e dificulta a coordenação das expectativas. "O Copom já elevou a Selic de 7,25% para 11,75%, e a projeção para o IPCA não saiu do lugar. O fato é que a inflação se cristalizou na casa de 6%", afirma.
Esse analista lembra que o Copom não tinha como escapar da intensificação do aperto depois que o diretor de política econômica, Carlos Hamilton Araújo, ter afirmado, durante apresentação do Boletim Regional do BC em Florianópolis (SC), que iria recalibrar a política e que, para bom entendedor, "pingo é i". Parecia que o BC faria um trabalho ativo de controle das expectativas, mas o comunicado jogou água na fervura. Como resultado, lembra este profissional, as taxas de juros futuros curtas caíram, e as longas avançaram - um sinal claro de falta de confiança. "Na verdade, a comunicação é muito confusa e não dá para saber o que o Copom quer", diz.
Para Carlos Kawall, economista-chefe do Banco J. Safra, a comunicação recente indica que o BC está atento. "O que ele está dizendo agora é que não será complacente e que a política monetária tem que ser ativa", diz. Em sua opinião, a decisão da próxima reunião ainda está em aberto, já que o cenário pode variar bastante até lá. "O BC só vai decidir o que fazer com os juros daqui a cerca de 40 dias, o que é bastante tempo", afirma.
Na semana que vem, por exemplo, há reunião do Federal Reserve e uma mudança na comunicação do banco central americano é esperada, o que pode movimentar o mercado, lembra Kawall. "O quadro inflacionário ainda será muito desafiador", diz. Por isso, o economista prevê que o BC irá elevar a taxa Selic em 0,50 ponto percentual na reunião de janeiro e encerrará o ciclo em março, com 0,25 ponto.
Além da troca de expressões para se referir à política monetária, Tombini também afirmou no Congresso Nacional que a meta de superávit primário de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2015 levaria a "política fiscal para o campo neutro, talvez ligeiramente contracionista no período à frente". Isso foi interpretado com mais um sinal de que o Copom pretende desacelerar o ritmo. "Ajustar a política monetária com o argumento de que o fiscal será melhor lá na frente é um equívoco. Tem que agir de acordo com a política atual, que ainda é mais expansionista", diz um profissional.
Kawall, do Safra, discorda da tese de que o BC poderia diminuir o ritmo por conta da promessa na área fiscal. "Não acho que eles irão baixar a guarda porque há um ajuste fiscal cuja execução é difícil em um momento de economia estagnada", diz.
Tony Volpon, chefe de pesquisas para mercados emergentes das Américas do Nomura, destoa e avalia a comunicação do BC como eficaz. Com o comunicado, diz Volpon, o Copom quis desautorizar apostas em alta de 0,75 ponto em janeiro e em um ciclo que levasse a Selic a até 13% ao ano. "Era o que estava começando a se 'precificado' na curva de juros e ele foi bem sucedido em comunicar que não compactuava com isso. Eu gostei do uso da parcimônia", diz.
O diretor do Nomura ressalta que boa parte das críticas à comunicação referem-se mais ao desagrado de parte do mercado com a estratégia do BC, ou seja, com a condução da política monetária. Mesmo assim, Volpon diz "não saber exatamente" o que Tombini quis dizer com a palavra "ativa" e que talvez a ata traga a explicação.
Para Carlos Eduardo Gonçalves, professor do Departamento de Economia da Universidade de São Paulo (USP), desde pelo menos 2012 a comunicação do BC é errática e pouco elucida sobre a estratégia de política monetária.
No episódio mais recente, diz Gonçalves, ao tentar tirar do radar do mercado uma alta de 0,75 ponto em janeiro, o Copom fez com parte dos investidores passasse a apostar em elevação de 0,25 ponto. "Ele acabou tirando a potência da política monetária, num momento em que a expectativa de inflação está em 6,5%", afirma. "A comunicação tem poucos sinais e muito ruído. Será preciso que o Copom solte umas dez atas coerentes para recuperar a credibilidade."
Na apresentação da nova equipe econômica, no dia 27 de novembro, a política monetária estava "especialmente vigilante", garantiu Alexandre Tombini, o presidente do BC. Em 3 de dezembro, ao mesmo tempo em que intensificou o ritmo de aperto e elevou a taxa Selic em 0,50 ponto, para 11,75%, o BC avisou: daqui para frente, a política monetária seria conduzida com parcimônia. No dia 9, em audiência pública no Congresso Nacional, Tombini não falou nem "parcimônia" nem "especialmente vigilante". A política monetária, disse o presidente do BC, deve se manter "ativa".
Ao invés de vir para explicar, a expressão "ativa" acabou por confundir ainda mais. Em conversa com economistas, alguns com passagem pelo próprio BC, o Valor ouviu interpretações díspares. Consenso apenas em torno da expectativa de que a ata do Comitê de Política Monetária (Copom), que sai hoje, esclareça, afinal, qual é o recado que o BC quer passar. E, se o documento ainda deixar dúvidas, Tombini terá uma segunda chance, em almoço hoje na Federação Brasileira de Bancos (Febraban).
"O forte do BC nunca foi a comunicação", ironiza um ex-diretor do BC, que, apesar disso, faz uma leitura de qual deve ser a mensagem por trás dos sinais mistos das últimas semanas. Provavelmente, diz, o Copom está tentando sinalizar que o ciclo de aperto será extenso, mas feito a passos moderados.
Para o ex-diretor, com uso da palavra parcimônia em seu comunicado, o BC quis mostrar que pode desacelerar o ritmo e subir a Selic em 0,25 ponto percentual, para 12%, em janeiro. Mas, para evitar a ideia de uma política monetária mais branda, Tombini usou a palavra "ativa", indicando que o ciclo não necessariamente será curto. "A ata vai tentar explicar isso."
Para um participante do mercado, a ata representa uma nova chance para o Copom deixar claro o que pretende. Tanto a referência à parcimônia quanto o uso do adjetivo ativa, no lugar do "especialmente vigilante", sugerem que o BC não apenas quer diminuir o ritmo em janeiro como não vai estender o ciclo de aperto.
Na ata, diz esse profissional, o Copom pode tanto ratificar o quadro de aperto menos intenso quanto "desmentir" o comunicado e adotar uma postura mais dura. Seja qual for a escolha, esse zigue-zague da comunicação é ruim e mostra que o BC não tem uma "estratégia clara" e age "ao sabor dos ventos" - o que mina a credibilidade e dificulta a coordenação das expectativas. "O Copom já elevou a Selic de 7,25% para 11,75%, e a projeção para o IPCA não saiu do lugar. O fato é que a inflação se cristalizou na casa de 6%", afirma.
Esse analista lembra que o Copom não tinha como escapar da intensificação do aperto depois que o diretor de política econômica, Carlos Hamilton Araújo, ter afirmado, durante apresentação do Boletim Regional do BC em Florianópolis (SC), que iria recalibrar a política e que, para bom entendedor, "pingo é i". Parecia que o BC faria um trabalho ativo de controle das expectativas, mas o comunicado jogou água na fervura. Como resultado, lembra este profissional, as taxas de juros futuros curtas caíram, e as longas avançaram - um sinal claro de falta de confiança. "Na verdade, a comunicação é muito confusa e não dá para saber o que o Copom quer", diz.
Para Carlos Kawall, economista-chefe do Banco J. Safra, a comunicação recente indica que o BC está atento. "O que ele está dizendo agora é que não será complacente e que a política monetária tem que ser ativa", diz. Em sua opinião, a decisão da próxima reunião ainda está em aberto, já que o cenário pode variar bastante até lá. "O BC só vai decidir o que fazer com os juros daqui a cerca de 40 dias, o que é bastante tempo", afirma.
Na semana que vem, por exemplo, há reunião do Federal Reserve e uma mudança na comunicação do banco central americano é esperada, o que pode movimentar o mercado, lembra Kawall. "O quadro inflacionário ainda será muito desafiador", diz. Por isso, o economista prevê que o BC irá elevar a taxa Selic em 0,50 ponto percentual na reunião de janeiro e encerrará o ciclo em março, com 0,25 ponto.
Além da troca de expressões para se referir à política monetária, Tombini também afirmou no Congresso Nacional que a meta de superávit primário de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2015 levaria a "política fiscal para o campo neutro, talvez ligeiramente contracionista no período à frente". Isso foi interpretado com mais um sinal de que o Copom pretende desacelerar o ritmo. "Ajustar a política monetária com o argumento de que o fiscal será melhor lá na frente é um equívoco. Tem que agir de acordo com a política atual, que ainda é mais expansionista", diz um profissional.
Kawall, do Safra, discorda da tese de que o BC poderia diminuir o ritmo por conta da promessa na área fiscal. "Não acho que eles irão baixar a guarda porque há um ajuste fiscal cuja execução é difícil em um momento de economia estagnada", diz.
Tony Volpon, chefe de pesquisas para mercados emergentes das Américas do Nomura, destoa e avalia a comunicação do BC como eficaz. Com o comunicado, diz Volpon, o Copom quis desautorizar apostas em alta de 0,75 ponto em janeiro e em um ciclo que levasse a Selic a até 13% ao ano. "Era o que estava começando a se 'precificado' na curva de juros e ele foi bem sucedido em comunicar que não compactuava com isso. Eu gostei do uso da parcimônia", diz.
O diretor do Nomura ressalta que boa parte das críticas à comunicação referem-se mais ao desagrado de parte do mercado com a estratégia do BC, ou seja, com a condução da política monetária. Mesmo assim, Volpon diz "não saber exatamente" o que Tombini quis dizer com a palavra "ativa" e que talvez a ata traga a explicação.
Para Carlos Eduardo Gonçalves, professor do Departamento de Economia da Universidade de São Paulo (USP), desde pelo menos 2012 a comunicação do BC é errática e pouco elucida sobre a estratégia de política monetária.
No episódio mais recente, diz Gonçalves, ao tentar tirar do radar do mercado uma alta de 0,75 ponto em janeiro, o Copom fez com parte dos investidores passasse a apostar em elevação de 0,25 ponto. "Ele acabou tirando a potência da política monetária, num momento em que a expectativa de inflação está em 6,5%", afirma. "A comunicação tem poucos sinais e muito ruído. Será preciso que o Copom solte umas dez atas coerentes para recuperar a credibilidade."
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