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A piora nas economias argentina e venezuelana deprimiu a perspectiva para o saldo comercial brasileiro deste ano.
A intensificação nos dois países, a partir de janeiro, da diminuição das reservas externas, a dificuldade na obtenção de dólares e políticas de controle de importações devem diminuir em cerca de US$ 4 bilhões as exportações brasileiras para esses destinos, afetando principalmente o desempenho dos manufaturados.
Apesar de ainda não aparecer nas estimativas do mercado, o superávit esperado para este ano está mais próximo agora dos US$ 2,6 bilhões registrados em 2013, de acordo com analistas, representantes da indústria e exportadores ouvidos pelo Valor.
No boletim Focus, divulgado ontem, a estimativa é que a balança comercial tenha superávit de US$ 7,9 bilhões, valor similar à previsão feita em dezembro.
Nos dados gerais da balança, contudo, o início deste ano está pior do que observado em 2013. O déficit comercial de janeiro até a semana passada foi de US$ 6,7 bilhões, valor US$ 2,1 bilhões maior do que o observado no mesmo período do ano passado.
O golpe mais forte virá da Argentina, que comprou US$ 18 bilhões em manufaturas brasileiras em 2013. Neste ano, entretanto, a retração do consumo doméstico e a forte desvalorização recente do peso argentino devem tirar US$ 3 bilhões das exportações do Brasil, projeção feita tanto pela Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) quanto pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
O Bradesco está mais pessimista e estima em US$ 3,9 bilhões a retração dos embarques à Argentina neste ano. A atual projeção do banco para a balança, de superávit de US$ 6,9 bilhões, não contabiliza a piora do vizinho.
José Augusto de Castro, presidente da AEB, vai esperar o próximo mês para revisar a projeção de balança da entidade, que, sem a retração dos argentinos, é de saldo positivo de US$ 7,2 bilhões.
O principal motivo para a redução é a necessidade de o comércio exterior argentino ter como meta superávit de US$ 10 bilhões em 2014, acima dos US$ 8 bilhões registrados ano passado, necessários para aumentar a entrada de dólares na economia. Só em janeiro, as reservas internacionais da Argentina recuaram 9,6%. Hoje, estão estimadas em US$ 27,7 bilhões.
Com a deterioração, as importações terão que ser reduzidas em US$ 5 bilhões, já que as divisas com a venda de grãos, principalmente da soja, vão render menos neste ano em função de preços menores no mercado internacional.
“A Argentina vai deixar de comprar do Brasil, não vai esfriar tanto o comércio com os asiáticos. É difícil prever o comportamento do governo. Ano passado, ele colocou mais restrições no primeiro semestre e afrouxou o segundo”, diz Castro.
O presidente da AEB identifica três problemas na economia argentina que se aprofundaram neste ano: obtenção de licença pelos importadores, dificuldade de obter dólares para pagar as compras externas e o aumento do custo dos importados, por causa da recente desvalorização do peso.
Com o mercado argentino respondendo por um quinto das exportações de manufaturados, a Fiesp se diz preocupada. O setor automobilístico, que se aproveitou do aumento da compra de automóveis pela Argentina ano passado – uma forma de os consumidores argentinos se protegerem da inflação -, deve absorver a maior parte da retração esperada.
“A situação nos preocupa, porque todo o impacto vai ser sentido na balança de manufaturados”, afirma Thomas Zanotto, diretor-adjunto de comércio exterior da Fiesp.
O encolhimento das vendas à Venezuela vai retirar mais US$ 1 bilhão do saldo comercial deste ano. Apesar de a corrente de comércio com os venezuelanos não ter impacto substancial no resultado total, o saldo é bem favorável ao Brasil.
Ano passado, o superávit de US$ 3,6 bilhões ocorreu em virtude de US$ 4,9 bilhões em exportações, principalmente de frangos e bovinos e manufaturados diversos, como eletrônicos, eletrodomésticos e máquinas e equipamentos.
Problemas similares ao argentino, contudo, devem causar o recuo, como a dificuldade em prever o comportamento do governo venezuelano, que controla os empréstimos em dólares aos importadores ou compra diretamente produtos brasileiros, principalmente alimentos industrializados.
As reservas internacionais venezuelanas estão em US$ 20,7 bilhões e em queda, o que levou o câmbio paralelo a disparar e o governo do presidente Nicolás Maduro a racionar ainda mais a oferta de dólares.
Outro fator é a desvalorização cambial do país, que elevou a inflação a 56% ao ano e diminuiu o poder de compra dos venezuelanos. Em janeiro, as exportações brasileiras à Venezuela recuaram 14,9% ante janeiro de 2013.
Rodrigo Branco, pesquisador da Uerj, chama a atenção para o aumento do uso de cotas para consumo. “A Venezuela é importante por causa do nosso superávit com eles. Em algum momento eles vão ter que ajustar a economia e isso vai nos afetar. Mas não vai haver um colapso no comércio, porque eles precisam importar para comer e isso vai ser a última coisa na qual o governo vai mexer”, diz Branco.
Fernando Ribeiro, técnico de planejamento e pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), vê um “acirramento” nas contradições das economias argentina e venezuelana e aponta para o efeito o resultado do comércio exterior brasileiro.
“Em termos de exportações totais não é um prejuízo grande, mas haverá impacto no saldo comercial de 2014. As projeções feitas em dezembro não contavam com essa deterioração. Hoje, US$ 2 bilhões vão fazer a diferença entre ter um superávit ou um déficit na balança comercial”, afirma.
Fonte: Valor Econômico, Por Rodrigo Pedroso
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