terça-feira, 15 de maio de 2012

Ajuda externa diminui e pode afetar demanda


Valor Econômico - 15/05/2012
Por Sergio Lamucci | De São Paulo
Reflexo em grande parte da queda dos preços de commodities, a piora dos termos de troca registrada desde outubro de 2011 indica que deve diminuir o espaço para a demanda doméstica crescer bem acima do Produto Interno Bruto (PIB), como ocorreu ao longo dos últimos anos. De 2006 a 2011, a demanda interna (consumo das famílias, consumo do governo e investimento) avançou em média 5,6% ao ano, acima dos 4,2% do PIB no mesmo período, sem que isso se traduzisse numa deterioração acentuada das contas externas ou em grandes pressões inflacionárias, aponta um estudo do ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsman, sócio da Schwartsman & Associados.

Segundo ele, isso foi possível porque os termos de troca (a relação entre preços de exportação e de importação) subiram com força nesse período, uma vez que o boom de commodities jogou para cima as cotações das vendas externas. O saldo comercial continuou robusto, mesmo com um forte aumento do volume de importações. Hoje, porém, parece ter ficado para trás a era de ganhos contínuos dos termos de troca, que subiram quase 30% entre 2006 e 2011, segundo a Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex).

No primeiro trimestre, os termos de troca ficaram em média 6,5% inferiores ao nível atingido no terceiro trimestre do ano passado, por causa do desempenho mais fraco dos produtos primários. Em abril, tiveram uma pequena alta em relação ao mês anterior, mas ainda estão 7,7% abaixo da máxima de setembro de 2011.

Para ter uma ideia do tamanho do ganho proporcionado pelos termos de troca, Schwartsman estima que o superávit comercial do ano passado, de US$ 29,8 bilhões, seria um déficit de US$ 48 bilhões caso os preços de exportação e de importação tivessem ficado na média de 1978-2011. O exercício supõe que as quantidades não teriam se alterado. Em 2011, em vez de um déficit em conta corrente (resultado das transações comerciais, de serviços e rendas com o exterior) de US$ 52,6 bilhões, ou 2,1% do PIB, ele teria sido de US$ 130 bilhões, ou 5,3% do PIB.

O volume importado em 2011 ficou 78% acima do nível de 2006 e o de exportação, apenas 3,5%. A alta forte dos preços de exportação, contudo, possibilitou que o país importasse uma quantidade muito maior de bens estrangeiros sem causar um déficit na balança comercial. Nesse período, as cotações das vendas externas aumentaram 79,5% e os das compras, 39,1%.

Para mostrar o impacto negativo da recente piora dos termos de troca, Schwartsman estimou qual teria sido o resultado da balança de janeiro a março com os preços de exportação e de importação no mesmo nível do terceiro trimestre de 2011. Em vez de um superávit de US$ 5,015 bilhões, o número teria ficado em US$ 7,835 bilhões, em números com ajuste sazonal. É um saldo US$ 2,820 bilhões menor, que se deve principalmente à queda de exportações, que ficaram US$ 3,5 bilhões menores.

Para ele, o resultado está longe de ser desastroso porque os termos de troca ainda estão em níveis bastante acima da média histórica. O ponto é que um cenário de piora da relação entre preços de exportação e de importação indica que a demanda doméstica não poderá continuar a crescer a um ritmo bastante superior ao do PIB potencial, diz Schwartsman, referindo-se ao controverso conceito que tenta medir o ritmo de expansão da economia que não provoca pressões inflacionárias. Ele estima o PIB potencial entre 4% e 4,5%.

O economista-chefe da Votorantim Corretora, Roberto Padovani, acha que, no curto prazo, os termos de troca não voltarão às máximas atingidas no terceiro trimestre de 2011, mas deverão seguir em níveis ainda altos. Para ele, as commodities tendem a mostrar uma ligeira trajetória de alta daqui para frente, mas bem mais lenta do que a do período entre 2004 e 2008 - alimentada pela demanda feroz da China - e também no pós-crise - com picos induzidos pela abundante liquidez internacional, dada a política monetária expansionista dos países desenvolvidos.

Em abril, documento do Fundo Monetário Internacional enfatizou que "os preços das commodities não devem crescer no mesmo forte ritmo visto na década passada", como destaca relatório da LCA Consultores. O Fundo não aposta em tombo das cotações, mas tampouco crê num ciclo de alta forte como nos anos 2000, o fator que determinou a disparada dos termos de troca brasileiros, diz a LCA.

Padovani acredita numa recuperação gradual da economia global nos próximos meses. Ele não vê uma desaceleração abrupta da China, porque o país tem espaço fiscal e monetário para impulsionar a atividade. "Vejo uma perspectiva mais favorável para as commodities agrícolas do que para as metálicas, porque a China deve começar a mudar o mix de crescimento, dando mais força ao consumo que ao investimento." Com isso, a demanda doméstica ainda teria espaço para crescer mais que o PIB, mas o diferencial teria que ser menor que nos últimos anos.

Schwartsman diz que o avanço dos preços de exportação a um ritmo superior ao de importação ajudou a manter a inflação sob controle, uma vez que os ganhos de termos de troca contribuíram para valorizar o câmbio, segurando os preços de produtos manufaturados. Segundo ele, entre 2006 e 2010, uma alta de 10% do índice de commodities CRB resultava numa valorização de 6% do real - a apreciação do câmbio, desse modo, atenuava uma parte considerável da alta dos produtos básicos.

Ele também observa que o Brasil passou a importar muito mais, o que fez com que uma parcela maior da oferta de bens comercializáveis internacionalmente (os tradables) fosse atendida por bens de fora do país. Para Schwartsman, isso liberou recursos para o setor não comercializável, aliviando um pouco a pressão sobre esse segmento - novos trabalhadores que se juntaram à força de trabalho foram para o setor de serviços, em vez de ir para a indústria.

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