quarta-feira, 6 de junho de 2012

A estratégia de câmbio e juros do BC

Valor Econômico - 06/06/2012
Por Cristiano Romero


O desempenho decepcionante do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre não muda a estratégia da política de juros do Banco Central (BC). O crescimento de apenas 0,2% da economia já estava na conta do BC, que, por meio do IBC-Br, indicador que estima o comportamento da atividade econômica, projetara expansão de apenas 0,15% entre janeiro e março.

Se nada de extraordinário ocorrer até a próxima reunião, marcada para 11 de julho, o Comitê de Política Monetária (Copom) promoverá mais uma redução de 50 pontos-base na taxa básica de juros (Selic), fixando-a em 8% ao ano. Dado o elevado grau de incerteza da economia mundial e de seus efeitos sobre o Brasil, o movimento seguinte do Comitê ainda é incerto. As indicações do que será feito serão dadas apenas em meados de junho, à época do próximo encontro do Copom.

O ambiente internacional, variável-chave no cenário com que o BC trabalha, é dado por baixo crescimento na Europa, com recessão em alguns países; recuperação moderada da economia americana; e pouso suave da China (crescimento entre 7,5% e 8%). Esse quadro só se altera se houver um evento nas próximas semanas.

Real se move, desde maio, alinhado com o dólar index

No ano passado e no início deste, "evento" poderia ser a quebra de um banco ou o calote de um governo. Agora, evento seria, por exemplo, a saída da Grécia da zona do euro. Está na conta, mas há o contágio. "Tem gente que diz que, diante disso [da saída da Grécia do euro], os governos europeus farão mais sacrifício. Podem até fazer, mas o problema são os mercados. "Who"s next?" (quem é o próximo) é a pergunta que os mercados vão fazer", pondera uma autoridade brasileira.

O Banco Central tem convicção de que está no caminho certo ao testar novos patamares para a Selic, que já se encontra no menor valor histórico. O mundo piorou de janeiro para cá e a melhor indicação disso é a cotação do título de 10 anos do Tesouro americano. Trata-se do ativo de maior liquidez do planeta. Sua cotação chegou a bater em 2,4% ao ano e, agora, está abaixo de 1,5%.

De janeiro a março, as bolsas de valores, movidas pelo excesso de liquidez provocado pela atuação dos principais bancos centrais, chegaram a acumular ganho médio de 20%. De lá para cá, já perderam tudo e muitas estão em terreno negativo. "Estava todo o mundo surfando num inverno ameno, inclusive, o México. O cenário mudou", diz um integrante da equipe econômica.

Esse cenário tem derrubado, por um lado, a confiança dos empresários nacionais, o que deprime a taxa de crescimento da economia, mas, por outro, tem ajudado a desinflacionar os preços internacionais. Isso auxiliou o BC a reduzir a inflação acumulada em 12 meses aqui dentro - de 7,3% para 5,1% entre setembro de 2011 e abril de 2012 - e a diminuir a taxa de juros.

"Estamos explorando novas realidades", explica uma fonte graduada, reagindo às críticas de que o BC só pensa em crescimento. "O crescimento da economia vem abaixo do potencial há alguns trimestres, logo, você não vai ter pressão inflacionária pelo lado da demanda."

Como o cenário internacional não indica a ocorrência de choques de oferta, o governo avalia que há um conforto, do ponto de vista dos preços, que permite ao BC continuar baixando os juros. Os preços das commodities estão em queda há semanas. A variável que poderia complicar a equação é a taxa de câmbio, que, com o agravamento da crise, tende a desvalorizar-se, pressionando os preços dos produtos importados.

Nessa seara, o BC já promoveu um freio de arrumação, com intervenções no mercado de câmbio. Em março e um pouco em abril, quando o humor lá fora começou a mudar de forma acentuada, o BC deu fôlego ao processo de desvalorização do real em relação ao dólar. A depreciação já ocorreria naturalmente, graças à piora dos termos de troca (a relação entre preços de produtos exportados e importados). Mas o BC optou por dar força ao movimento, como se aproveitasse a oportunidade para colocar o real num novo patamar - que o mercado hoje identifica como sendo R$ 2,00.

Num dado momento, a desvalorização acentuada do real provocou uma piora na percepção dos investidores, principalmente de estrangeiros, que antes estavam mais otimistas com o país do que os nacionais. Desde então, o BC decidiu alinhar os movimentos do real aos do dólar index (US Dollar Index), indicador que mede o valor do dólar dos Estados Unidos em relação a uma cesta de moedas.

Segundo o Valor Data, de 30 de abril até ontem, o dólar index variou 5,1%. No mesmo período, o real teve desvalorização de 5,5%, enquanto o peso mexicano teve depreciação de 8,5%. Ainda no mesmo período, duas moedas, de países também exportadores de commodities como o Brasil, tiveram desempenho em linha com o dólar index: o dólar canadense (desvalorização de 4,9%) e o dólar australiano (-6,6%).

"O real está alinhadíssimo", diz uma fonte, lembrando que o México, o atual "queridinho" do mercado, teve desvalorização muito mais forte desde o fim de abril. "Nós não temos uma meta de câmbio, mas geralmente quando você vê o negócio "despegando", é porque tem alguma disfuncionalidade. Então, o BC atua."

Um assessor do governo lembra que o regime de câmbio é flutuante e que ele é a primeira linha de defesa em caso de crise. "Se tiver um evento de cauda, o dólar vai para aonde tiver que ir. Só que não vai se sustentar. Você não vai subsidiar a saída."

O BC acredita, como declarou ontem o presidente Alexandre Tombini no Congresso Nacional, que a economia vai acelerar nos próximos trimestres, principalmente no segundo semestre. A presidente Dilma Rousseff já estaria consciente, porém, de que, em 2012, dificilmente o PIB avançará mais de 3%. A dúvida do governo é se abre mão da meta de superávit primário de 3,1% do PIB para estimular a economia.

Nas conversas internas, Dilma tem dito que a crise na Europa é séria, mas que, quando passar, "daqui a dois ou três anos", o velho continente voltará forte, com uma ou várias moedas, mas com bons fundamentos (custo de capital e de mão de obra baixos, produtividade elevada). Para o Brasil, que não está em crise, a receita é se posicionar bem. Por isso, o governo trabalha para reduzir custo de capital, qualificar a mão de obra, diminuir a carga tributária e investir em infraestrutura.

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