O governo que assumir o país após as eleições deste ano, seja ele qual for, precisa adotar medidas rigorosas de ajuste fiscal, comentam economistas. Nesta semana, foi divulgado um déficit primário de R$ 14,460 bilhões em agosto deste ano, quarto resultado negativo consecutivo, distanciando o alcance da meta de R$ 99 bilhões deste ano. A balança comercial brasileira ainda teve seu pior desempenho para meses de setembro desde 1998. O FMI também informou que o Brasil tornou-se, no ano passado, o país emergente com maior déficit externo do mundo. Especialistas apontam para um caminho cada vez mais próximo de um quadro de estagflação - que se caracteriza por redução do nível de atividade da economia com aumento do desemprego e da inflação.
O relatório trimestral do Fundo Monetário Internacional aponta que, em oito anos, o Brasil deixou de apresentar resultado positivo para chegar a um rombo de R$ 81 bilhões nas transações externas, que incluem comércio exterior, fluxo de investimentos, gastos de turistas, investimentos, entre outras questões. Para o FMI, é hora do país adotar medidas, antes que consequências negativas apareçam.
O setor público consolidado – governos federal, estaduais e municipais e empresas estatais – apresentou déficit primário de R$ 14,460 bilhões, em agosto, de acordo com dados divulgados pelo Banco Central (BC). Foi o quarto déficit primário consecutivo e o pior resultado para agosto na série histórica, iniciada em dezembro de 2001. Nos oito meses do ano, então, o superávit primário chegou a R$ 10,205 bilhões. A meta do ano, contudo, era chegar a R$ 99 bilhões. O superávit primário é a economia de recursos para pagar os juros da dívida pública e reduzir o endividamento do governo no médio e longo prazos.
A balança comercial brasileira, por sua vez, teve o pior desempenho para meses de setembro desde 1998. O déficit (exportações menores que importações) foi de US$ 939 milhões no mês passado. O valor resulta de US$ 19,617 bilhões em exportações e US$ 20,556 bilhões em importações. No acumulado do ano, é negativo em US$ 690 milhões.
Felipe Salto, economista da Tendências Consultoria, alerta justamente que o problema não é a questão fiscal isolada, mas toda uma conjuntura de dados ruins, com déficit em conta corrente migrando para 4% do PIB no próximo ano, déficit fiscal crescente e resultado primário muito baixo. Na conjuntura macroeconômica, lembra Salto, o país cresce muito pouco e até apresentou recessão técnica. O desequilíbrio fiscal, então, fragiliza o Brasil perante países comparáveis.
De acordo com Salto, não dá para olhar para a dívida bruta e dizer que países desenvolvidas têm o seu dobro, porque o custo da dívida brasileira representa cinco vezes aquilo que o país gasta com investimento. "No curto prazo, a gente ainda não sofre tanto as consequências, porque demora um pouco para a reversão do fluxo de capitais do país para que agências precifiquem isso levando a uma perda do grau de investimento, mas a gente caminha nesta direção."
Salto destaca que o grau de investimento do país é importante, sim, e lembra que foi ele que permitiu o fluxo de capital que entrou no Brasil, depois que o país ganhou credibilidade internacional. Ele alerta que, do jeito que está, pode haver mais inflação, menos crescimento, piora dos fluxos de investimento e juros maiores exigidos pelo mercado para financiar a dívida do país.
O economista recomenta uma mudanças urgentes na política fiscal, sob pena do Brasil assistir a um longo processo de ajuste, "que vai custar caro".
Mauro Rochlin, professor de economia dos MBAs da FGV, não esperava um déficit público muito diferente do divulgado pelo BC, levando em conta que, nos últimos três ou quatro anos, o superávit vem se estreitando cada vez mais, com o recurso de uma contabilidade criativa que "posterga despesas e inventa receitas".
Rochlin lembra que é preciso disposição para realizar ajustes - "criar ajuste fiscal é descontentamento". "Qualquer que seja o novo governo, a gente vai passar por um período de maior dificuldade. Não acredito que o desemprego permaneça em um patamar tão baixo, deve haver crescimento da renda mais modesto, senão estagnado. A questão fiscal tem suscitado uma série de preocupações. Quanto antes for feito um ajuste, melhor. Se houver determinação, pode-se afastar o risco de rebaixamento da nota."
Heron do Carmo, professor de Economia na USP, reforça que a situação já era esperada, pois, apesar de alguns bons resultados na economia brasileira como uma certa recuperação na atividade industrial, o quadro que vem se agravando. "Isso pode levar a mais inflação. O desemprego está em um patamar confortável, mas a perspectiva é que se continuar esse cenário de atividade econômica pode passar a uma situação pior que a atual. Ou seja, é um cenário preocupante", alerta.
O professor acredita que, com a definição do candidato vencedor da eleição para presidência, o Brasil terá uma definição que pode aliviar o horizonte, a partir um anúncio de ajuste nas finanças públicas, que permita acerto do câmbio para compensar a piora nas exportações, com política fiscal mais apertada. Ele não descarta também um aumento nos impostos, para retomar as expectativas de retomada do círculo virtuoso da economia.
"Estamos em uma situação em que um evento agrava o outro. O risco é a estagflação, uma economia estagnada, com inflação mais alta, comprometendo a renda, e justamente a renda de uma parcela da população mais desfavorecida."
Heron acredita que 2015 deve ser um ano mais apertado, que pode ter uma perspectiva menos negativa caso medidas sejam tomadas já nesta ano, caso o governo atual seja reeleito. "A economia pode entrar num processo de recessão. Nós estamos crescendo nada, daqui para passar a retração não é um caminho distante, estamos muito perto disso. É fundamental reverter esta situação."
Fonte: Jornal do Brasil
Associação Paulista de Estudos Tributários, 2/10/2014 10:08:27
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