A sobre-estadia, ou demurrage, é a indenização paga pelo afretador, pelo tempo que exceder ao previsto para a estadia do navio no porto durante as operações de carga e descarga, conforme estipulado na carta-partida (instrumento que formaliza o contrato de fretamento de embarcações).
O tema é relevante no comércio internacional, conforme o relator da matéria no STJ, ministro Luis Felipe Salomão, porque quase a totalidade das mercadorias importadas ou exportadas pelo Brasil passa por portos e, havendo demora em relação à carga ou descarga, incide a demurrage.
Disposição de contrato
A Quarta Turma entendeu que, quando oriunda de disposição contratual, que estabelece os dados e critérios necessários ao cálculo dos valores devidos (aferidos, após a devolução do container, com a multiplicação dos dias de atraso pelo valor das diárias), a taxa de sobre-estadia gera dívida líquida e certa. Por isso, incide o prazo prescricional de cinco anos, previsto no artigo 206, parágrafo 5º, inciso I, do Código Civil.
No caso em que não conste no contrato de afretamento nenhuma previsão acerca da devolução tardia do container, eventual demanda que vise a cobrança dos valores de sobre-estadia obedecerá ao prazo de dez anos, tendo em vista a ausência de disposição legal prevendo prazo menor, conforme estabelece o artigo 205 do Código Civil.
Antes da vigência do Código Civil de 2002, o STJ entende que deve prevalecer o prazo prescricional de um ano, previsto pelo artigo 449 do Código Comercial para os casos de demurrage. Em um recurso do Paraná (REsp 176.903), o Tribunal decidiu que há equiparação entre a devolução tardia do container e a sobre-estadia do navio, aplicando-se o prazo anual. Esse artigo, contudo, foi revogado pelo Código Civil de 2002.
Normas incompatíveis
O ministro explicou em seu voto que alguns defendem a aplicação, por analogia, da regra prevista no artigo 22 da Lei 9.611, que trata do transporte multimodal (articulação entre modos de transporte de forma a tornar mais rápidas as operações).
Esse prazo, entretanto, de acordo com o ministro, não se aplica à cobrança de sobre-estadia, assim como não se aplica também o prazo de um ano previsto pelo Decreto-Lei 116/67, que trata das operações inerentes ao transporte de mercadorias por via aquática nos portos brasileiros.
Segundo Salomão, a revogação expressa da primeira parte do Código Comercial explicitou a incompatibilidade das normas mercantis com a nova legislação imposta pelo Código Civil. O poder jurídico de exigir o pagamento da demurrage, segundo ele, nasce do próprio contrato, que traz em seu bojo os dados e critérios necessários ao cálculo dos valores devidos a título de indenização.
O termo inicial de contagem do prazo prescricional é a data de devolução do container, tendo em vista que, antes disso, o proprietário não sabe qual a extensão do seu direito. “No nosso ordenamento jurídico, o prazo prescricional está submetido ao princípio do actio nata, segundo o qual a prescrição tem início com o conhecimento do fato e a certeza da extensão do dano”, disse Salomão.
Fonte: STJ